Da criança generalizada à indústria dos diagnósticos

Autores

  • Rosane Braga de Melo UFRRJ; EPFCL-Brasil

DOI:

https://doi.org/10.31683/stylus.v1i50.1249

Palavras-chave:

Criança generalizada, Diagnósticos, Patologização, Medicalização

Resumo

Lacan (1967) nos diz que a aliança entre o discurso científico e o discurso capitalista será responsável pela universalização e homogeneização dos indivíduos. E há um preço a se pagar pela universalização do sujeito, pois trata-se de uma subversão sem precedentes. A tese de Lacan indica a segregação como consequência da universalização (Soler, 1998) e, ao retomar a trilha percorrida por Michel Foucault na sua crítica ao campo médico-psiquiátrico, conclui que a psiquiatria aliada ao discurso da ciência nos levará ao campo de concentração generalizado, ou seja: separar, isolar, concentrar para dominar a partir de um projeto de uniformização. O discurso da ciência, que hoje a psiquiatria biologizante representa, difundiu o poder psiquiátrico que seguiu na esteira de uma prática médica que já nasceu como um sistema de vigilância. O que sobrevive entre nós é a lógica do isolamento que Lacan (1967) atribui ao nascimento do campo da psiquiatria. Isolar e concentrar pessoas é o tributo dessa universalização, e Michel Foucault (1973-1974) considerou que este poder psiquiátrico se realizou a partir da infância. Propomos abordar a expansão dos diagnósticos e a medicalização de crianças no Brasil, como efeito da universalização dos modos de gozo. De que modos a criança generalizada favoreceu que a infância se tornasse um campo em disputa na lógica do mercado? Será esta a herança e o preço que pagamos pela universalização do sujeito?

Downloads

Não há dados estatísticos.

Biografia do Autor

Rosane Braga de Melo, UFRRJ; EPFCL-Brasil

Psicóloga. Psicanalista, membro AME da Escola de Psicanálise dos Fóruns do Campo Lacaniano-Brasil, Diretora da AFCL/EPFCL-Brasil, Membro do Colegiado de FCCL-RJ. Professora do curso de Psicologia e do curso de Mestrado em Psicologia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.

Referências

Arendt, H. (2012). Origens do totalitarismo: antissemitismo, imperialismo, totalitarismo. São Paulo: Companhia das Letras. (Trabalho original publicado em 1949)

Ariès, P. (1981). História social da criança e da família (2a ed.). Rio de Janeiro: Guanabara.

Bercherie, P. (1980). Os fundamentos da clínica: história e estrutura do saber psiquiátrico. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor.

Broderick, A. A. (2022). The autism industrial complex: how branding, marketing, and capital investment turned autism into big business. Maine: Myers Education Press.

Castro, L. R. (2021). Infâncias do Sul Global. Salvador: EDUFBA.

Didier-Wiell, A., Weiss, E., & Gravas, F. (2007). Quartier Lacan. Rio de Janeiro: Companhia de Freud.

Fernandes, A. D. S. A., Couto, M. C. V., Andrada, B. C., & Delgado, P. G. G. (2024). A “indústria” do autismo no contexto brasileiro atual: contribuição ao debate. Material Técnico.

Foucault, M. (2006). O poder psiquiátrico. São Paulo: Martins Fontes. (Trabalho original publicado em 1973-1974)

Foucault, M. (2010). História da loucura na Idade Clássica. São Paulo: Perspectiva. (Trabalho original publicado em 1972)

Freud, S. (2006). Introducción del narcisismo. In S. Freud. Obras completas de Sigmund Freud (Vol. 14). Buenos Aires: Amorrortu. (Trabalho original publicado em 1914)

Freud, S. (2006). Psicologia de las masas y análisis del yo. In S. Freud. Obras completas de Sigmund Freud (Vol. 18). Buenos Aires: Amorrortu. (Trabalho original publicado em 1921)

Freud, S. (2006). 32a conferencia: angustia y vida pulsional. In S. Freud. Obras completas de Sigmund Freud (Vol. 22). Buenos Aires: Amorrortu. (Trabalho original publicado em 1933)

Gonçalves, J., & Peixoto, M. A. (2001). O menino selvagem: estudo do caso de uma criança selvagem retratado no filme “O menino selvagem” de François Truffaut. Lisboa: Universidade de Lisboa. Recuperado de https://webpages.ciencias.ulisboa.pt/~ommartins/cinema/dossier/meninoselvagem.pdf

Lacan, J. (1967). Breve discurso a los psiquiatras. Recuperado de http://www.teebuenosaires.com.ar/biblioteca/trad_07.pdf

Lacan, J. (1990). O seminário, livro 11: os quatro conceitos fundamentais da psicanálise (4a ed.). Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor. (Trabalho original publicado em 1964)

Lacan, J. (1992). O seminário, livro 17: o avesso da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor. (Trabalho original publicado em 1969-1970)

Lacan, J. (2003a). Alocução sobre as psicoses da criança. In J. Lacan. Outros escritos (pp. 359-368). Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor. (Trabalho original publicado em 1967)

Lacan, J. (2003b). Proposição de 9 de outubro de 1967 sobre o psicanalista da Escola. In J. Lacan. Outros escritos (pp. 249-264). Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor.

Lacan, J. (2012). O seminário, livro 19: …ou pior. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor. (Trabalho original publicado em 1971-1972)

Ortega, F., & Vidal, F. (2007). Mapeamento do sujeito cerebral na cultura contemporânea. Revista Eletrônica de Comunicação, Informação e Inovação em Saúde, 1(2), 257-261.

Sauret, M.-J., Askofare, S., & Macary-Garipuy, P. (2016). Controvérsias atuais no tratamento do autismo na França: o que está em jogo para a psicanálise. Estudos e Pesquisas em Psicologia, 16(spe), 1098-1118. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1808-42812016000400003

Sheffer, E. (2023). Crianças de Asperger: as origens do autismo na Viena nazista. Rio de Janeiro: Record.

Soler, C. (2014). Lo que queda de la infancia. Medellín: Asociación Foro del Campo Lacaniano de Medellín.

Soler, C. (2018). Les ségrégations. Séminaire Champ Lacanien à Paris. Mensuel Paris, 128.

Whitaker, R. (2017). Anatomia de uma epidemia: pílulas mágicas, drogas psiquiátricas e o aumento assombroso da doença mental. Rio de Janeiro: Fiocruz.

Zorzanelli, R., Bezerra, J. R. B., & Costa, J. F. (Orgs.) (2015). A criação de diagnósticos na psiquiatria contemporânea. Rio de Janeiro: Garamond.

Downloads

Publicado

16-07-2025

Como Citar

de Melo, R. B. (2025). Da criança generalizada à indústria dos diagnósticos. Revista De Psicanálise Stylus, 1(50), pp. 21–32. https://doi.org/10.31683/stylus.v1i50.1249

Edição

Seção

TRABALHO CRÍTICO COM OS CONCEITOS